Nunca entendi quem
não sente que sente
não remói os acontecimentos
esquece as brigas
perdoa num zás-trás
não implica por qualquer coisa
não duvida das certezas
confia em coaches
não faz listas
não se organiza pelo Excel
anda de bicicleta elétrica
enlouquece por futebol
não curte música
se impacienta com séries de TV
vive em academia
toma chá em vez de café
ou toma café sem açúcar
não faz planos
não fala sobre trabalho
reclama de feriado
ama bloco de carnaval
come jiló
dança na frente de outras gentes
faz chá revelação
comemora mesversário
usa meia dúzia de reticências
Desconfio que por aí
alguém
diz de mim
coisas do tipo
Num movimento recíproco
não entende
quase nada deste ser humano
torce o nariz para as estranhezas
que carrego
(algumas com orgulho)
e eu nem quero tomar conhecimento
ou vou ruminar esse amargor
até perder o gosto
Levarei mais trinta anos
para desvendar
o enigma da convivência
O outro não sou eu
e eu não sou o outro
Somos conjuntos independentes
Não estou contida nele/nela
nem ele/ela em mim
Cabe-nos
mirar na interseção
ou, na sua falta,
se não for obrigada
seguir em outro rumo
e evitar a colisão
Que impiedoso o tempo
Ele se move, sorrateiro
e eu nem percebo
Aí olho para a cara
do meu filho
e comparo com a foto
de um ano atrás
É o mesmo menino
eu posso notar
no olhar
na boca
no nariz
nos traços que ainda estão lá
Só não encontro mais
o mesmo menino
O rosto tem uma mudança
um quê de amadurecimento
o bebê se foi
o corpo estirou
ele já passa de um metro
Faço então as contas
quatro anos completos
uma copa
uma olimpíada
uma eleição
um censo
uma pandemia
uma guerra
Coube tanto em 1.461 dias
Por aqui
tantas fraldas
tantos sorrisos
tantas lágrimas
tantos porquês
tanto orgulho
tantas chinelas Havaianas
E eu fico com a pergunta:
por que a pressa, tempo?
Chegou o dia do ano em que recebemos as flores e os bombons, além das mensagens que exaltam a delicadeza e a força da mulher (Erasmo Carlos começou a cantar ao meu ouvido). O dia em que pessoas que nunca se preocuparam com a questão de gênero se convertem, de repente, em defensoras das lutas femininas.
Oito de março é o dia vergonha alheia, que me deixa desconfortável e me faz rezar pelo dia nove. Passo as horas rolando o feed, fugindo dos parabéns e ignorando as mensagens “carinhosas”, em especial aquelas acompanhadas de rosas ou algo do tipo.
Não, eu não sou contra o Dia Internacional das Mulheres. Muito pelo contrário. Aborreço-me com a distorção da data, com o uso mercadológico, com a farsa de machistas, com a tentativa de nos fazer esquecer a desigualdade e a violência que sofremos.
Já escrevi outras vezes (aqui e aqui) sobre o meu incômodo. Dessa vez, sugiro dois ensaios que podem ajudar a entender a situação das mulheres e o modo de pensar acerca do feminismo.
De domingo para cá, vi tantas postagens de luto, feitas até por conhecidos e conhecidas que eu considerava conscientes. Elas retratam um Deus triste com o resultado das eleições no Brasil e se perguntam qual será o futuro do país. Vi cenas de gente vestida de verde e amarelo em meio a orações e lágrimas. Vi imagens de pessoas bloqueando estradas e pedindo intervenção militar.
Eu não entendo.
O candidato perdedor, que infelizmente ainda é o presidente do país, defende a liberação de armas e o fuzilamento de quem o critica, já declarou que sua especialidade é matar e anda com gente que não aprecia muito a paz (vide o cara que atirou em policiais e a mulher que perseguiu uma pessoa na rua com arma em punho).
Esse mesmo candidato apostou na mentira, no medo, na guerra, na desunião, em narrativas repetitivas (comunismo, corrupção, ideologia de gênero, aborto).
Ele não se esforçou para conter o novo coronavírus, nem se solidarizou com as famílias que perderam entes queridos para a doença. Pelo contrário, debochou de gente sem respirar, fez questão de sair às ruas e de incentivar a aglomeração durante a pandemia.
Homenageou um torturador em seu voto no golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff, disse que uma deputada não merecia ser estuprada por ser feia, falou grosso com jornalistas, julgou que meninas de 14 e 15 eram prostitutas porque são venezuelanas e se arrumavam em um sábado à tarde. Para completar, declarou que “pintou um clima” entre elas e ele (um idoso de 67 anos de idade).
This website uses cookies to improve your experience while you navigate through the website. Out of these, the cookies that are categorized as necessary are stored on your browser as they are essential for the working of basic functionalities of the website. We also use third-party cookies that help us analyze and understand how you use this website. These cookies will be stored in your browser only with your consent. You also have the option to opt-out of these cookies. But opting out of some of these cookies may affect your browsing experience.
Necessary cookies are absolutely essential for the website to function properly. This category only includes cookies that ensures basic functionalities and security features of the website. These cookies do not store any personal information.
Any cookies that may not be particularly necessary for the website to function and is used specifically to collect user personal data via analytics, ads, other embedded contents are termed as non-necessary cookies. It is mandatory to procure user consent prior to running these cookies on your website.