17 de maio de 2023

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[Resenha] Estela sem Deus

Por Jeferson Tenório

  • Título Original: Estela sem Deus
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: Companhia das Letras
  • Ano de Publicação: 2022
  • Número de Páginas: 184
Sinopse: Um pouco antes das eleições de 1989, a protagonista deste romance migra de Porto Alegre para o Rio de Janeiro. Entre as duas cidades, entre a infância e a adolescência pobres, acompanhamos a trajetória de Estela em meio a uma sequência de violências, faltas e desamparos a que ela, a mãe e o irmão são submetidos. Manifestando suas inquietações com a vida, as perguntas da jovem perscrutam seu mundo e as dores que carrega. Na relação ambígua com a família, nos embates entre religião e liberdade: a força da escrita de Jeferson Tenório surpreende mais uma vez nesta narrativa sobre crescer num país cruel e desigual.
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Estela vive em Porto Alegre com a mãe, Irene, e o irmão caçula, Augusto, quase abandonada pelo pai, que só aparece quando tem vontade. Ela sonha em ser filósofa, embora não saiba o que os filósofos fazem de fato.

As filósofas são assim: dizem palavras que só vão fazer sentido depois de terem feito certas voltas dentro da gente […] (p. 13).

Ao se mudar para o Rio de Janeiro com o irmão sob os cuidados da madrinha Jurema, uma ferrenha religiosa, Estela se vê na contradição entre temer a Deus e não sentir sua presença, entre obedecer à mulher que a acolhe e viver em liberdade.

Estela sem Deus é criação de Jeferson Tenório, autor de O avesso da pele (Companhia das Letras, 2020), livro que lhe rendeu o Prêmio Jabuti. Além dessas duas obras, Tenório publicou O beijo na parede (Sulina, 2013).

O romance é narrado em primeira pessoa, em uma linguagem simples, coloquial, fácil de ler, entender e sentir. É um livro que impacta, incomoda e ecoa.

Nele acompanhamos a vida de uma adolescente, que pode ser igual à vida de muitas adolescentes em nosso país, marcada pela carência tanto de bens materiais como de carinho e orientação.

Estela não pode contar com o pai. Já a mãe protege os filhos, mas tem um jeito ríspido, de quem já sofreu tanto que precisa engolir o sofrimento para continuar a viver, que precisa administrar a tristeza, como a própria Estela relata. Nesse contexto, de quem luta para manter os filhos vivos sem aparentar fraqueza, envia-os para longe quando não pode garantir o seu sustento.

A violência contra as mulheres se apresenta em várias passagens, causada por homens que se sentem superiores, que se sentem donos dos corpos femininos. Vemos ainda racismo e fanatismo religioso.

[…] e demorei um tanto para entender que os meninos talvez não se aproximassem muito de mim por causa da minha cor preta e do meu cabelo crespo […] (p. 28).

Estela questiona (ela faz milhões de questionamentos) os desígnios de Deus: se ele é o pai, como dizem na bíblia e na igreja, por que deixa os filhos sofrerem?

As mulheres se destacam na obra. Conceição, madrinha Jurema, Edna e Melissa, cada uma delas com seu sofrimento particular, com sua experiência de abandono e violência, mesmo que não saibam demonstrar afeto e não tenham quase nada para repartir, encontram uma maneira de apoiar Irene, Estela e Augusto.

E Estela agradece qualquer oportunidade de estar perto da mãe, qualquer gesto daquela mulher em sua direção. Ela anseia por atenção, deseja ser amada, e a tentativa de suprir essa necessidade pode levá-la por caminhos imprevistos.

Em sua jornada, nem sempre linear, Estela realiza o sonho que parecia tão distante no início, apesar de não ter consciência de seu modo próprio de olhar o mundo e de sua inquietação em relação àquilo que a vida lhe oferece.

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