Ser mãe é padecer no paraíso — dizem as mães com sorrisos nos lábios.
Acho esse ditado um tanto infeliz, além de ineficaz quando se trata de atrair novas candidatas à maternidade. Aliás, nunca compreendi a necessidade que têm as mães de ver todas mulheres do mundo vivendo essa experiência. Se uma mulher confessar, diante de um grupo de mães, que não planeja ter filhos, vai escutar de 95% delas a seguinte resposta: “Ah, mas você tem que ter pelo menos um”. Pode testar!
Quando eu ouvia esse tipo de afirmação, revirava os olhos em pensamento. Primeiramente, porque qualquer frase que comece com “você tem que” não pode terminar bem. Em segundo lugar, se nem eu tenho certeza sobre as melhores escolhas para mim (eu, que vivo em mim há décadas), como outra pessoa terá?
É incoerente a frase que citei no início. Ela pretende ser isso mesmo, mas há um adicional. Há mães que se orgulham mais do padecimento do que do paraíso. A sociedade afirma o tempo inteiro (e, no dia das mães, tome-lhe mensagem) que mães são carinhosas, compreensivas, multitarefas; mães são isso e aquilo; só as mães sabem fazer tais coisas; só as mães cuidam e protegem, como se fôssemos umas idênticas às outras (como uma pessoa única). E, enquanto as mães se vangloriam de ser tão especiais e poderosas, quase divinas, vão ajeitando os ombros para segurar a carga.
Isso me incomoda. Uma mulher não deixa de ser mulher ao dar à luz um bebê. As mães são imperfeitas, nem sempre são compreensivas ou capazes de resolver as dores das crias. E, pasmem, podem até não amar os seres gerados em seu ventre.
De tanto se proclamar que não há maior amor no mundo, numa generalização absurda, as pessoas se escandalizam quando uma mãe rejeita um filho ou o abandona. “Como uma mãe pode fazer isso?” — logo vem o questionamento. Uma mãe é capaz de fazer isso, da mesma forma que centenas de pais o fazem.
Não julgo aqui se tais mães estão certas ou erradas (este papel não me cabe). Apenas opino que uma mãe abandona um filho porque é ser humano (e não anjo) — e ser humano, todo mundo sabe, é complexo, falho e, por vezes (muitas vezes), cruel.
Estou prestes a completar 25 meses de maternidade, talvez um período curto para avaliar a dimensão do padecimento. Reconheço a dificuldade e a grandiosidade da função materna, ainda mais porque, como é de conhecimento geral, grande parte das mães não tem apoio efetivo dos pais das crianças. Também identifico em mim amadurecimento nos últimos dois anos. Rejeito, porém, a insinuação de que a minha vida começou somente agora, a insistência de que devo viver exclusivamente para ser mãe.
Então, eu convido as mães a criar um movimento: “não tenho que sofrer para ser mãe”. Vamos dizer não aos rótulos que vêm fantasiados de homenagem, vamos recusar a imagem na qual se busca encaixar a totalidade das mães. Por mais honroso que pareça se sacrificar, ser a única capaz de solucionar os problemas dos filhos, suprimir os próprios desejos para viver os deles e se disfarçar de supermãe, isso pode trazer cansaço, culpa e, a médio e longo prazo, cobrança, ressentimento, vazio.
A alternativa é o equilíbrio: nem paraíso nem padecimento. É viver com os filhos e não para eles. É considerar os sonhos dos filhos, sem deixar de cultivar sonhos para si mesmas. É ser consciente da nossa impotência diante de uma imensidão de inconvenientes. É ser egoísta de vez em quando. É dividir a função de cuidar/educar, sempre que a oportunidade existir.
Vamos amar nossos filhos e ser as mães que podemos ser, sem estereótipos, sem o peso da perfeição. Amemos a nós mesmas também e nos lembremos da infinidade de papéis, além da maternidade, que estão à nossa disposição.
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