Ainda que a gente tente escapar, não há conserto
A poesia nos habita, é nossa natureza (trecho de “Minha natureza”, p. 28).
Para começar o ano por aqui, um lindo trabalho lançado no final do ano passado, uma novidade que veio contrastar com os acontecimentos tenebrosos do último trimestre de 2018.
Este é o primeiro livro de Ana Luiza Barreto, uma poeta baiana que tenho orgulho de apresentar como minha amiga e companheira de trabalho, de vida, de sonhos; que sabe combinar tão bem as palavras que consegue emocionar até mesmo com uma mensagem de celular.
Finuras, que eu tive a honra de conhecer ainda em gestação, é uma compilação de poemas que Ana (ou Cel Prado) vem publicando em um blog homônimo. Como ela mesma explica, é uma coletânea de poesias sobre o dia a dia, que, na minha opinião, tocam profundamente porque se aproximam do que vivemos e causam uma inevitável identificação.
Minha sensualidade mora nos saltos que eu não uso,
nos vestidos pretos que revelam minhas curvas e que estão guardados
[no armário (trecho de “Natural?”, p. 84).
Acho que com Ana Luiza me aproximei da poesia. Já falei para ela tantas vezes da minha dificuldade com esse gênero literário, ainda mais na tentativa de escrevê-lo. E ela me incentivou tantas vezes a me arriscar em versos. Ainda não consegui ou ainda não me arrisquei, mas isso tem me ajudado a escrever outros textos. Talvez eu tenha percebido que não há forma de escapar da poesia, como diz a citação apresentada no início desta publicação. Talvez ela viva mesmo em nós, mesmo que não consigamos notar.
Foi assim que gastamos meio minuto falando só com os olhos,
mas eu senti como se fosse um dia inteiro (trecho de “Silêncio”, p. 63).
O livro é uma coleção de reflexões sobre gente, sobre coisas que aconteceram ou quase aconteceram, sobre buscas pessoais, sobre o próprio ato de fazer poesia, sobre aquelas mínimas situações que, muitas vezes, passam sem que as notemos ou aquelas que, mesmo pequenas, nos parecem tão grandes que nos fazem perder o caminho.
Se não fosse do jeito que foi
Se eu só tivesse vivido
e não inventasse de enxergar poesia
onde não havia
Este poema não existiria (trecho de “Até aqui”, p. 91).
Finuras foi escrito no “idioma que serve para falar das coisas que não se diz com palavras” (p. 47) e se tornou um canal de comunicação entre um coração pulsante e outros tantos que não resistirão a seus versos sensíveis e sinceros. Por isso, Finuras é recomendado a todos. Não há contraindicação. Porque precisamos descansar um pouco deste mundo que se mostra cada vez mais pesado. Porque ansiamos por um distanciamento do cotidiano que comumente nos submerge em desânimo, em reprodução ou em desesperança. Porque necessitamos de mais delicadeza, de olhares mais generosos e palavras mais amenas. Porque necessitamos de mais poesia em nossa vida e em nossa convivência.
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