Domingo, 23 de junho de 1985.
Querida Marilu,
Na fotografia que observo agora (a que acompanha esta carta), estamos apenas você e eu na saída da maternidade — eu com a aparência abatida; você dormindo envolta em um cobertor verde e amarelo. Seu pai insistiu em registrar o momento: disse que anos depois essa seria uma importante recordação para nós. Ele acertou na previsão: olhei para essa foto tantas vezes durante os últimos anos, querendo retornar àquele instante em que não tinha qualquer certeza sobre o futuro, mas previa uma vida diferente dali em diante.
Era jovem, inexperiente e tola. Imaginei que seria a melhor mãe, embora não tivesse prática alguma com crianças. Algo deveria despertar em mim, um tipo de sabedoria que viesse no pacote da maternidade. Também parecia fácil: bastava agir exatamente ao contrário da minha mãe. E, como não havia qualquer pessoa por perto para me indicar os caminhos, criei os meus próprios, contando apenas com minha intuição. Tracei planos para os dias, os meses e os anos seguintes.
Quando entramos na casa, seu pai bateu mais uma foto, agora só sua, deitada no berço que não usou até completar um ano. Você aparece vestida num macacão florido, com gorro, luvas e sapatinhos de tricô. Mas essa imagem você deve conhecer — ficava no porta-retratos sobre a estante da sala, em destaque, como um troféu, para que os visitantes vissem como nos orgulhávamos de tê-la em nossa família.
A casa estava preparada para recebê-la. Seu pai e eu não descansamos até preenchermos o espaço com tudo o que julgávamos indispensável ao seu bem-estar. Decoramos o quarto, compramos roupas e brinquedos. O berço ele demorou semanas para construir, usando habilidades manuais que pouco exercitava. Eu confeccionei algumas peças de crochê para completar o enxoval. Ganhamos também presentes de nossos amigos, vizinhos e parentes.
Com o passar dos dias, vimos que o médico tinha razão: a vermelhidão de sua pele logo se resumiu a pequenas manchas rosadas e desapareceu. Mas outra preocupação nasceu: você tinha dificuldades para dormir. E chorava, chorava, chorava. Às vezes, não se acalmava sequer com minha voz. Eu a acompanhava no choro, me culpando por não descobrir a causa do seu desconforto e desconfiando de minha capacidade materna. O pediatra dizia que aquilo era normal. Você não estava doente. Só precisava se acostumar à rotina.
Quando você finalmente cansava de se fazer de forte e dormia, era eu quem não descansava e passava horas velando seu sono, mesmo sem poder sustentar meu corpo de pé ou meus olhos abertos. Antônio permanecia ao meu lado por um tempo, mas logo ia para a cama, pois devia partir para o trabalho nas primeiras horas da manhã seguinte.
À medida que os dias avançaram, seu pai, você e eu começamos a nos habituar à nova vida. Já entendíamos mais facilmente o que você queria expressar com suas lágrimas; e você passou a dormir mais e em horários regulares. Assim, também me tranquilizei e voltei a confiar que poderia ser uma mãe melhor que qualquer outra.
Repare agora na foto, filha. Não sei se consegue perceber uma mulher realizada, apesar do cansaço de horas de trabalho de parto e dias de internação. Talvez você não veja isso, não depois de nossa história, mas não duvide de minha satisfação com meu novo papel. Saí daquele hospital disposta a fazer tudo por você.
Com amor,
Neusa
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